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O uso de drogas em adolescentes e comorbidades psiquiátricas

A adolescência é uma fase de desenvolvimento integral na qual ocorrem inúmeras modificações no organismo e, em especial, no sistema nervoso central (SNC). Todas essas transformações marcam a transição entre a infância e a vida adulta, quando os jovens deverão enfrentar diversos desafios do desenvolvimento, tais como criar suas próprias identidades, seus valores e relacionamentos, separar-se de seus pais e familiares, assim como assumir as responsabilidades e os papéis de adultos.

A reorganização estrutural e funcional do cérebro predispõe o jovem a reações imaturas, como a impulsividade, a irritabilidade, a insegurança e o desejo de aceitação. Ocorre uma mudança significativa do sistema de recompensa, que se torna insensível e mais difícil de ser ativado. Há uma perda temporária de função do comportamento motivado, que leva à sensação de que todas as coisas que antes eram prazerosas agora são desinteressantes e entediantes. Dessa forma, o jovem sente-se movido a buscar novos interesses e prazeres [1].

Para a maioria de adolescentes, as bebidas alcoólicas e o tabaco serão a combinação mais frequente, seguidos de álcool e maconha, tabaco e maconha e álcool e alucinógenos.

Segundo dados do CEBRID (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), as drogas mais consumidas entre adolescentes são álcool e tabaco [2]. Apesar de terem seu uso proibido por lei para menores de 18 anos, ambas são precocemente usadas e livremente vendidas aos adolescentes brasileiros.

A comorbidade (também conhecida como diagnóstico duplo) é o diagnóstico de dois ou mais transtornos psiquiátricos em um único paciente. Neste caso, cada uma das patologias influenciaria os sintomas, a evolução e a resposta terapêutica da outra.

A presença de comorbidades psiquiátricas em adolescentes usuários de drogas pode resultar em baixa adesão ao tratamento, pior prognóstico, dificuldade de diagnóstico e altas taxas de utilização de serviços de saúde gerando maiores custos para o indivíduo, sociedade e familiares. Muitas pesquisas apresentam associação do uso de drogas com transtornos psiquiátricos, tais como:

• Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
• Transtorno de Conduta
• Transtorno Bipolar
• Transtorno depressivo
• Transtornos de ansiedade
• Transtornos alimentares
• Transtorno de Personalidade

A seguir, serão detalhadas as duas principais patologias psiquiátricas em comorbidade com transtorno por uso de substâncias em adolescentes;

1. Transtorno de Conduta e
2. Transtorno de déficit de Atenção e hiperatividade (TDAH).

1 - Transtorno de Conduta

O transtorno da conduta é um dos transtornos psiquiátricos mais frequentes na infância e um dos maiores motivos de encaminhamento ao psiquiatra infantil.

São caracterizados por padrões persistentes de conduta antissocial, agressiva ou desafiante.

Na base deste transtorno está a tendência permanente para apresentar comportamentos que incomodam e perturbam, além do envolvimento em atividades perigosas e até mesmo ilegais.

Esses jovens não aparentam sofrimento psíquico ou constrangimento com as próprias atitudes e não se importam em ferir os sentimentos das pessoas ou desrespeitar seus direitos. Portanto, seu comportamento apresenta maior impacto nos outros do que em si mesmo.

Tal comportamento gera grandes violações das expectativas sociais próprias à idade da criança; deve haver mais do que as travessuras infantis ou a rebeldia do adolescente e se trata de um padrão constante de comportamento (seis meses ou mais).

O diagnóstico médico se baseia na presença de condutas anormalmente frequentes e graves do seguinte tipo:

• Manifestações excessivas de agressividade e de tirania;
• Crueldade com relação a outras pessoas ou a animais;
• Destruição dos bens de terceiros;
• Condutas de atear fogo;
• Roubos;
• Mentiras repetidas;
• Falta às aulas e fugas de casa;
• Crises de birra e de desobediência.

O transtorno da conduta está frequentemente associado a baixo rendimento escolar e a problemas de relacionamento com colegas, trazendo limitações acadêmicas e sociais ao indivíduo. São frequentes os comportamentos de risco envolvendo atividades sexuais, uso de drogas e até mesmo tentativas de suicídio e o envolvimento com drogas e gangues pode iniciar o jovem na criminalidade.

Os comportamentos antissociais tendem a persistir, parecendo faltar à capacidade de aprender com as consequências negativas dos próprios atos.

2 - Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade

O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) é um transtorno psiquiátrico altamente prevalente entre os adolescentes usuários de drogas.

Inúmeras evidências têm indicado a importância do TDAH no surgimento do uso de substâncias em adolescentes. O surgimento precoce de perda de controle sobre os comportamentos, incluindo-se os sintomas principais do TDAH (desatenção, hiperatividade e impulsividade), antecedem o início de uso de substâncias em criança.

O novelty-seeking (comportamento de busca intensa por novidades) na faixa etária entre os seis e dez anos de idade (relatado pelos professores como inquietação, incapacidade em se manter sentada na cadeira, com comportamentos de correr e pular de forma inapropriada, com movimentação constante de todo o corpo e das mãos como se estivesse nervosa) são indícios do uso de drogas e tabagismo na adolescência.

Para se diagnosticar um caso de TDAH é necessário que o indivíduo em questão apresente pelo menos seis dos sintomas de desatenção e/ou seis dos sintomas de hiperatividade; além disso os sintomas devem manifestar-se em pelo menos dois ambientes diferentes e por um período superior a seis meses.

Critérios de diagnóstico:

Desatenção:

1. Frequentemente deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros por descuido em atividades escolares, de trabalho ou outras.
2. Com frequência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas.
3. Com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra.
4. Com frequência não segue instruções e não termina seus deveres escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não devido a comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções).
5. Com frequência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades.
6. Com frequência evita, antipatiza ou reluta a envolver-se em tarefas que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou deveres de casa).
7. Com frequência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (por ex., brinquedos, tarefas escolares, lápis, livros ou outros materiais).
8. É facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa.
9. Com frequência apresenta esquecimento em atividades diárias.

Hiperatividade:

1. Frequentemente agita as mãos ou os pés.
2. Frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado.
3. Frequentemente corre ou escala em demasia, em situações nas quais isto inapropriado (em adolescentes e adultos, pode estar limitado a sensações subjetivas de inquietação).
4. Com frequência tem dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer.
5. Está frequentemente "a mil" ou muitas vezes age como se estivesse "a todo vapor".
6. Frequentemente fala em demasia.
7. Impulsividade.
8. Frequentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas.
9. Com frequência tem dificuldade para aguardar sua vez.
10. Frequentemente interrompe ou se mete em assuntos de outros.

CONCLUSÃO

O abuso de drogas é considerado um problema de saúde pública que deverá ser enfrentado por diferentes profissionais.

O abuso e a dependência de substâncias estão relacionados com acidentes, comportamentos violentos e de risco, vandalismo, desordem pública, roubos, assaltos, suicídios, homicídios, morte prematura e determina um alto custo social e econômico, no qual o etanol é um dos principais determinantes[3].

Há várias evidências de que o transtorno por uso de substâncias apresenta relação com outros transtornos os psiquiátricos principalmente com transtorno de conduta e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, conforme apresentado anteriormente.

Referências Bibliográficas

1. Lopes, G.M., et al., Use of psychoactive substances by adolescents: current panorama. Revista Brasileira de Psiquiatria, 2013. 35: p. S51-S61.
2. Carlini, E., A. Noto, and Z. Sanchez, VI Levantamento Nacional sobre o Consumo de Drogas Psicotrópicas entre Estudantes de Ensino Fundamental e Médio das Redes Pública e Privada de Ensino nas 27 Capitais Brasileiras-2010. CEBRID-Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas: UNIFESP-Universidade Federal de São Paulo, 2010.
3. Pianca, T.G., et al., Prevalência de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade e transtorno de conduta entre adolescentes usuários de crack internados em duas unidades hospitalares de Porto Alegre. Clinical and biomedical research. Porto Alegre, 2014.